quarta-feira, 13 de março de 2013

Animus jocandi legaliza empreendimento na Lua





Com o devido aconselhamento jurídico, um empresário pode vender até lotes na Lua — e ficar multimilionário — sem nunca ter qualquer entrevero com a Polícia ou com a Justiça. A prova é a empresa imobiliária Lunar Embassy, do empresário americano Dennis Hope, que no decurso de três décadas já vendeu quase 600 milhões de acres em terrenos na Lua. Entre seus clientes estão celebridades como Barbara Walters, George Lucas, o ex-presidente Ronald Reagan e o ex-presidente George Bush pai, de acordo com a revista Discovery.
Dennis Hope começou a vender lotes na Lua em um momento de desespero. O divórcio, na década de 1980, o deixou em ruínas. Mas não sem seu senso de humor, adquirido na profissão de ventríloquo. Da janela de seu apartamento, olhava a Lua, enquanto considerava que sua situação financeira seria resolvida se ele tivesse um terreno para vender. "Na verdade, eu tenho", lhe ocorreu. "A Lua tem mais de 10 bilhões de acres sem dono. Basta eu tomar posse". Hope conseguiu registrar a propriedade da Lua em São Francisco, Califórnia e criou a Lunar Embassy, que hoje tem franquias em diversos países. Pelo menos isso é parte da história que vem junto com cada "escritura" de transferência de imóvel lunar.
O empresário já foi retratado na Times, na CNN, no USA Today e no Space.com. Nesta segunda-feira (11/3), o jornal The New York Times publicou um artigo, assinado pelo cineasta canadense Simon Ennis, que produziu um documentário de 6m26s sobre o empreendimento lunático de Dennis Hope. O documentário explica, mesmo que rapidamente, porque o "empresário" nunca foi incomodado pela Justiça. Depois de consultar seus advogados, Hope recorreu a um artifício que lhe deu tranquilidade jurídica: duas palavras incrustadas, em letras minúsculas, no "contrato" de venda.
Ele incluiu a expressão "novelty gift" na "escritura de compra e venda de imóvel", que funciona como contrato. Isso invalida qualquer suposição ou pretensão de que o direito a um terreno na Lua tenha valor jurídico ou efeito prático. As palavras "novelty gift" ou "novelty item" colocam o empreendimento em sua verdadeira dimensão: a venda do lote na Lua não é para valer — e não há propaganda enganosa.
"Novelty gift" e "novelty item" se referem a um pequeno item, que tem uma qualidade peculiar, única, que pode ser um objeto de enfeite ou diversão. Um exemplo é o revólver de brinquedo que, quando disparado, libera uma pequena bandeira com a inscrição "BANG". No final das contas, a "escritura" de compra de um lote na Lua é, para todos os efeitos, uma  brincadeira — um enfeite, que pode ser colocado em um quadro, pendurado na parede da sala e exibido às visitas. Junto com a escritura, o feliz comprador também recebe um "Mapa da Lua".
Essa expressão aparece no que os americanos chamam de "fine print", que é uma espécie de declaração de isenção, muito usada em anúncios publicitários, sempre em letras muito pequenas. É um recurso usado, por exemplo, em anúncios dos melhores remédios do mundo. Nas "fine prints", que muita gente precisa de lupa para ler, há uma advertência: "Antes de usar, consulte seu médico. Você pode ter uma convulsão e morrer".
O site e-What?, que tenta apontar furos no empreendimento lunar para proteger consumidores desavisados, reconhece que a inclusão dos termos "novelty item" na documentação da empresa cria uma proteção jurídica para ele. A definição pode classificar o item como um objeto de animus jocandi — sempre contestado pelo animus beligerandi e diferenciado do animus corrigendi.
O animus jocandi, como se sabe, revela a intenção de entreter ou de brincar. E é uma proteção constante nos tribunais a humoristas e programas humorísticos. Na verdade, os milhares de clientes da Lunar Embassy sabem o que estão fazendo, e compram uma escritura de um lote na Lua para entrar na brincadeira ou para recompensar Hope pelo que consideram uma "ideia brilhante". Tudo com animus jocandi, a não ser pela susceptibilidade a fraudes dos incautos.
Hope diz que na ventriloquia, o boneco lhe ensinou uma lição valiosa: "Você pode dizer o maior absurdo do mundo às pessoas, se emendar um sorriso ao fim de suas palavras". Hope mantém um escritório em Nevada, onde tudo funciona segundo os conformes profissionais, desde o atendimento telefônico à remessa da "escritura". A única diferença aos padrões da moda, é o título do cargo. Em vez de se atribuir o cargo de chief-executive, ele escolheu um título mais apropriado: chief-cheese(queijo-chefe).
Atualmente, qualquer pessoa pode adquirir um lote na Lua por apenas US$ 24, o mesmo preço a décadas. O preço assim se discrimina: US$ 19,99 pelo custo do lote, US$ 1,51 pelo imposto territorial planetário e US$ 2,50 pela colocação do nome do feliz proprietário na "escritura".
http://www.conjur.com.br/2013-mar-12/americano-fica-milionario-vendendo-lotes-lua-problemas-justica

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